Apoio de prefeitos e deputados decide eleição para governador? Especialista avalia cenários para 2026 na Bahia
Farol da Bahia conversou com o cientista político João Vitor Vilas Boas

Foto: Ascom/Divulgação
A menos de um ano das eleições gerais de 2026, o cenário político na Bahia começa a ganhar contornos mais definidos.
O governador Jerônimo Rodrigues (PT) entra na disputa com vantagem por estar no comando da máquina do Estado, o que possibilita a atração de novos aliados com maior facilidade.
A candidatura governista à reeleição ainda conta com um forte cabo eleitoral em nível nacional: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que mesmo enfrentando desgaste na popularidade mantém respaldo entre eleitores baianos.
A oposição, antes acuada no primeiro semestre, reagiu nos últimos meses. O pré-candidato ao governo ACM Neto (União Brasil), embora já tenha perdido inúmeros prefeitos, deixou de apenas observar os movimentos do governo e iniciou a cooptação de deputados estaduais.
Até agora, foram dois nomes: Nelson Leal (PP) e Cafu Barreto (PSD). O principal entrave oposicionista está na indefinição da candidatura presidencial da direita.
A escolha entre um nome moderado, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ou um perfil mais alinhado ao bolsonarismo pode alterar de forma significativa a estratégia de Neto.
Para analisar essas movimentações e projetar o que ainda pode mudar até o pleito, o Farol da Bahia entrevistou o cientista político João Vitor Vilas Boas.
Confira a entrevista completa:
FB: Jerônimo Rodrigues conta com o apoio de aproximadamente 355 prefeitos, enquanto ACM Neto tem 62. A vantagem expressiva do petista indica apenas a força da máquina estadual ou é um fator que deve preocupar a oposição?
João Vitor: A vantagem de Jerônimo entre prefeitos reflete, sim, a força da máquina estadual. Logicamente, obras, convênios e presença institucional são fatores decisivos. Mas isso não vai garantir a eleição. A Bahia já mostrou, em 2006, que o desgaste acumulado pode superar estruturas locais, quando Jaques Wagner derrotou Paulo Souto, que contava com grande apoio dos prefeitos.
Hoje, o cenário é similar, mas do lado contrário: o desgaste se concentra no PT, sobretudo em temas como segurança pública e obras estratégicas, e a oposição tem explorado isso com eficiência.
FB: Enquanto Jerônimo atrai prefeitos, Neto tem começado a atrair deputados estaduais. Como analisa o cenário eleitoral de 2026 neste momento?
João Vitor: O cenário ilustra bem como a política baiana muda rapidamente. Há poucos dias, ACM Neto parecia recuado no tabuleiro, assistindo a movimentações importantes como José Ronaldo, em Feira, e Zé Cocá, em Jequié, se aproximarem do governo.
Porém, em menos de uma semana, ele conseguiu atrair dois deputados estaduais governistas, o que sinaliza uma reacomodação de forças. Deputados só movem peças quando enxergam competitividade e essa mudança repentina reforça que a disputa está longe de estar definida.
A eleição será aberta e muito dura. O próprio núcleo do governo já admite preocupação, porque percebe que a base, embora numerosa, não está completamente blindada. Ou seja, Jerônimo segue forte no interior com prefeitos, mas Neto voltou a demonstrar capacidade de articulação, e isso devolve o dinamismo à oposição.
FB: A eleição baiana tende a se nacionalizar novamente, como ocorreu em 2022, ou o cenário local deve pesar mais desta vez?
João Vitor: Haverá influência nacional, mas o peso do cenário local será maior do que em 2022. A insatisfação do eleitor está muito ligada à segurança pública e à qualidade dos serviços estaduais.
Mesmo com palanques fortes, o eleitor baiano tende a avaliar o governador pela entrega concreta no território e não apenas pela figura presidencial. Por isso, a nacionalização não basta: quem vencer será o candidato que conseguir vincular seu nome a soluções reais para problemas da Bahia.
FB: Caso Tarcísio de Freitas seja candidato à Presidência, qual impacto esse nome pode gerar na Bahia?
João Vitor: Tarcísio tem potencial de unificar a direita e oferecer à oposição baiana um discurso pragmático semelhante ao usado pelo PT em 2022: “um presidente aliado pode destravar investimentos para o estado”.
Como ele já sinalizou proximidade com Neto, a chapa nacional pode fortalecer o discurso da oposição de que alinhamento político gera benefícios concretos.
Na prática, a presença de Tarcísio cria um teto de competitividade maior para Neto na Bahia e aumenta a pressão sobre o PT para mostrar resultados que neutralizem esse argumento.
FB: Você enxerga a possibilidade de ACM Neto ocupar uma vaga na chapa presidencial encabeçada por Tarcísio? Se isso ocorrer, qual nome seria melhor para o governo da Bahia?
João Vitor: A chance é muito remota. Para ser um nome de consenso da direita, Tarcísio dependerá do aval de Bolsonaro, que já declarou querer um vice da sua confiança, um critério no qual Neto não se enquadra.
Em um cenário improvável em que Neto fosse para a chapa presidencial, o nome mais natural para disputar o governo seria Bruno Reis: tem capital político, estrutura consolidada em Salvador e alinhamento completo com Neto. E a Prefeitura ficaria em mãos de uma figura de confiança, como Ana Paula Matos, o que garantiria continuidade e evitaria ruptura interna.
FB: Que impacto a entrada de Flávio Bolsonaro na disputa pela Presidência tem na Bahia?
João Vitor: A entrada de Flávio Bolsonaro na disputa presidencial tende a tensionar o comportamento do PL no estado. Com um Bolsonaro na cabeça de chapa, o partido passa a ser pressionado a demonstrar força local, o que recai diretamente sobre João Roma e reabre a discussão sobre lançar candidatura própria ao governo.
Até o lançamento do nome de Flávio, havia um entendimento em construção entre João Roma e ACM Neto, com a perspectiva de acomodação do PL na chapa majoritária e de um palanque estadual relativamente coordenado.
Contudo, com o novo contorno, para ACM Neto, o cenário é de perda em qualquer direção extrema. Uma associação explícita ao bolsonarismo pode afastar o eleitorado de centro, decisivo na Bahia.
Por outro lado, repetir o “tanto faz” de 2022, sem um alinhamento claro, mantém o risco de fragmentação da oposição, com o PL atuando de forma autônoma e corroendo sua base eleitoral.


